Perfil: O menino de um sonho realizado
Superando desafios e obstáculos, Michel Elói conseguiu realizar o desejo de vários garotos: ser um jogador profissional
Nascido em Divinópolis/MG, Michel Elói é mais um sonhador. Criado em um bairro distante, cercado de limitações, mas cheio de várzeas e campinhos destroçados, desde cedo seus pais observavam seu talento com a bola. Ele quebrava todas as lâmpadas da casa com suas brincadeiras. Com a redonda marcava todas as paredes de sua casa com a poeira que caia da rua sem calçamento de seu bairro simples, de pessoas humildes. Esse era o Del Rey, o bairro onde os sonhos de um menino simples se desabrocharam.
Michel corria e brincava com as crianças da vizinhança. Magrelo, era daqueles que todos gostavam de contar nas brincadeiras e nas artes. Uma vez deixou o bairro inteiro sem luz por ficar jogando a preferida de todos os brinquedos nos fios, a apaixonante bola. Sempre era um dos primeiros escolhidos nas peladas de futebol, em que separavam os grupos e dividiam as crianças em dois. Rápido, ligeiro, habilidoso, talentoso: eram características que todos, desde cedo, enxergavam no menino humilde, de olhar singelo e tímido.
A fé e a família
O menino magrelo e de olhar sincero carrega consigo uma fé inabalável. Sua frase é “Forte é aquele que crê”. A fé e a devoção fervorosa que vem de família o ajudam a superar todos os obstáculos e medos. A família, que sempre ensinou os valores de um ser humano honesto, integro e honroso com seus compromissos, ajudou a sempre traçar um caminho correto, prezar os ensinamentos de Deus. Viveu em um lar sempre acolhedor, regado de carinho e sorrisos sinceros, construído no amor. Mesmo sendo uma família cheia de limitações pelas condições de vida que levavam, sempre ofereceu o melhor para os filhos.
Com o apoio da família é que passou por cima de todas as barreiras e superou medos, como o de ser assaltado, ter sido refém, ter corrido risco de vida quando sua casa foi invadida por ladrões, no bairro em que seus sonhos eram criados. Naquele momento, a fé esteve presente a cada segundo e os pensamentos em Deus eram elevados a todo momento. Tanto que não aconteceu nada além de levarem o dinheiro que se encontrava na sua casa no momento. Lembrança ruim pelo resto de seus dias, mas que serve de lição para dar valor a vida.
Depois de ter passado tanto medo, o melhor era sair do bairro sem segurança, onde via seus melhores amigos crescerem e se envolverem com coisas ruins como drogas, assaltos, alguns acabando até na cadeia ou no cemitério. Era hora de mudar de casa, de mudar de bairro, mas era também a hora de colocar os sonhos no canteiro da realidade.
No sorriso vergonhoso de Elói transparece toda a simplicidade que seus amigos tanto admiram e se referem – amigos aqueles que viram o craque crescer para se tornar o que se tornou: o amigo cheio de talentos, honesto, leal e simples que todos consideram. Fez também amigos da bola, aqueles que foi adquirindo dentro de campo e conquistando a amizade verdadeira fora das quatro linhas. Eles que estão sempre longe, mas sempre considerando um ao outro.
Michel é também o namorado excepcional e diferente que a namorada enche os olhos para se referir. Aliás, é marcante o olhar apaixonado dela que, daqui a alguns dias, se tornará noiva e mulher. O menino homem, que é ciumento, ignorante, desorganizado, sem paciência, também consegue ser um cara educado, encantador, gentil quando quer.
Mas suas qualidades superam tanto seus defeitos que eles ficam quase mínimos quando falados fora de contexto.
A profissionalização
Dos times de campo do bairro Michel passou a frequentar as escolinhas de futebol. Começou a sonhar em ser um jogador renomado, famoso, querido e admirado por todos. Queria ser como seu ídolo Romário, o craque da bola, o baixinho que encantou a todos no mundo. Começou sua trajetória aos oito anos jogando na Ilha e ele recorda de todos os seus passos, dos ensinamentos de seus treinadores, das várias escolinhas em que passou até chegar a uma em especial, com um treinador especial. Foi esse técnico que lhe deu a esperança necessária para continuar a trilhar seus passos, para continuar a persistir em um sonho que poderia ser tão distante, mas que ele queria e precisava acreditar. José Carlos, treinador da Escolinha do Flamengo, disse-lhe que ele tinha potencial de ser um grande jogador e que disciplina e dedicação seriam essenciais para que seu sonho se tornasse real. Foi o responsável por abrir os olhos do mundo para o garoto humilde que sofria para ir todos os dias aos treinos e que se dedicava e amava o futebol além de tudo.
Em 2009 ele fez um teste no time da cidade, o tradicional Guarani, quando foi selecionado na peneirada e disputou no mesmo ano o Campeonato Mineiro Júnior. Em 2010 subiu para o profissional, mas fez poucas partidas. Foi a fase mais difícil que passou, pois eram poucas as oportunidades e Michel ficou muito tempo sem jogar. No entanto, sempre era incentivado pelo pai Douglas, que também já foi jogador do time da cidade, uma prova viva que talento vem de berço.
Seu pai, sempre elogiado por todos que o viram jogar, nunca deixou que seu filho se abatesse com as críticas e barreiras encontradas nos caminhos. Por isso, foi de grande importância para Michel continuar na luta por seus objetivos. Em 2011, o técnico José Ângelo comandava o time de Divinópolis no Campeonato Mineiro. Ele olhou para o menino esforçado, que treinava forte todos os dias, que mostrava vontade, e colocou-o para jogar. Ali viu a ponta de um talento promissor crescer. Mas o campeonato curto acabou e as mudanças para uma nova temporada sempre acontecem nos times de futebol. Foi quando chegou então um novo treinador para o time, Gian Rodrigues. No começo de outro campeonato, a Taça Minas Gerais, a expectativa não poderia ser diferente: a esperança de entrar como titular era nítida nos olhos de Michel, o reserva do time. Mas tudo tem sua hora.
E o seu jogo de estreia foi contra o Boa Esporte, em um empate satisfatório. Na partida ele foi titular e deu o passe para que o gol fosse feito e a igualdade do placar acontecesse. Depois deste jogo ganhou a confiança do treinador e dos parceiros e se firmou como titular.
No Campeonato Mineiro de 2012 ele teve sua grande chance. Michel jogou quase todos os jogos como titular e começou a ser o grande destaque do time, o grande jogador das partidas, sempre muito elogiado pela mídia local. Enaltecido frequentemente, tinha seu nome sempre citado nas resenhas esportivas da região, nas discussões do campeonato mineiro. Ele era o favorito em quase todas as partidas pelo seu time, até que chegou a se tornar o segundo patrimônio mais valioso que o Guarani tinha. Ele começou a ser visto fora de Divinópolis, começou a receber várias propostas de times de outros estados e de muitos empresários, até que conheceu Renato Moura e Eduardo Uram, os donos de seu passe.
Novos desafios
No primeiro contrato com os empresários, o frio na barriga, aquele sentimento que transborda, envaidece, o inacreditável e transformante acontecimento tão esperado. A segurança de ser um profissional capacitado e promissor consumia seu ser de felicidade e emoção. Depois do contrato assinado a incerteza de onde jogaria e a ansiedade de sentir a bola rolar em seus pés em um jogo novamente eram gigantescas. E seu segundo time como profissional foi o Boa Esporte. Era lá seu destino, disputar a Serie B do Campeonato Brasileiro. A oportunidade de crescer e amadurecer foram primordiais para um Michel mais preparado para vida. Disputou nove partidas pelo time, mas depois de uma expulsão foi isolado do grupo principal. Nesse período ele amargava nos treinos pesados, longe da família, namorada e amigos.
O Boa de Varginha foi essencial para sua formação, para se preparar para as próximas batalhas, pois os sonhos não param. Mas agora é tempo de férias, de namorar, curtir a família, jogar uma peladinha com os velhos e bons amigos e dar uma relaxada. Mas claro, sempre acreditando no que é capaz e esperando mais da vida. Mais da sua capacidade de superar as barreiras e realizar os sonhos para que novos projetos venham a acontecer.
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Reportagem/perfil produzido em novembro de 2012 pelo aluno do curso de Jornalismo da Faculdade Pitágoras Divinópolis/MG: Ana Cecília de Moura (3º Período)
Fotos: Arquivo Pessoal
Edição e Supervisão: Professor Ricardo Nogueira (MG 11.295 JP)